O Dr. Campos – Médico
O Dr. Campos residia na freguesia de Amoreira – numa moradia ajardinada - onde estava instalado o Consultório da Amoreira. Além disso, vinha também fazer consultas Olho Marinho, num consultório localizado num 1º andar da Casa Regedor da Freguesia, senhor José Dias. O acesso fazia-se por uma porta independente, subia-se umas escadinhas até ao hall - espécie de varandim quadrangular - e só depois é que se entrava no consultório.
A moradia do Regedor, que integrava uma adega colada à fachada principal, prolongava-se depois por um muro descendente até quase ao largo da fonte, fazia a curva e voltava a subir do outro lado, por uma vereda, até pegar novamente residência do Regedor. A sua frente ficava um pátio, baptizado por Largo do Zé Dias. Este Largo confinava com a parte lateral da “escola velha” e a residência do Padre Renato.
O Dr. Campos era também uma pessoa alta, bem constituída e usava óculos. Tinha sempre muitos doentes para tratar e era muitas vezes chamado de noite. Deslocava-se entre as freguesias do concelho de Óbidos – Vau, Usseira, Gaeiras, Olho Marinho e até a Povoação do Pó – num Volkswagen que comprara com a herança que recebera dos pais, conforme confessara um dia mais tarde, quando esteve hospitalizado no Hospital de Santa Maria.
O Dr. Campos era também uma pessoa muito impulsiva e não tinha papas na língua. Os doentes que não se portavam bem, não seguissem as suas prescrições mínimas, tinham que se haver com ele… Naturalmente, naquela época, não se fazia lá muitas dietas e sobretudo bebia-se bastante álcool – vinho e bagaço. Atrás das bebedeiras, lá vinham as cirroses (barriga de água…), úlceras, os reumatismos, etc. Por conta disso, o Dr. Campos é que se esfalfava a fazer visitas ao domicílio, rua acima rua abaixo: ver os seus doentes crónicos. Era pois natural que alguns deles ouvissem algum responso menos agradável. Aliás, até o Padre Renato, por outras razões, ouviu da parte do médico um desabafo nada lisonjeiro. Conta-se que numa ocasião em que o médico vinha a sair do seu consultório e se dirigiu ao seu carro, ao ligar as chaves, este não pegou logo. Então o Padre que estava por perto, “mete-se com ele” e diz: então Dr. o seu carro não pega? O médico, como que a pensar alto, desabafa: Olha quem! Anda sempre com a merda do carro dele avariado e vem agora falar do meu… O Padre Renato fingiu que não ouviu e foi a vida dele!
O Dr. Campos fumava bastante e tinha uma asma crónica. Ainda assim, andava sempre num frenesim. A par do seu feitio, era uma pessoa de grande generosidade e de uma sensibilidade sem limites para com as pessoas de parcos recursos. Muitos doentes não tinham só dificuldades em pagar as suas consultas mas ainda em comprar os medicamentos que lhes eram prescritos. O Dr. Campos conhecia as suas dificuldades e por isso não cobrava dinheiro pela maioria das consultas que fazia. Além disso, ainda retirava medicamentos do Hospital da Misericórdia de Óbidos - onde também prestava assistência - para entregar aos pacientes mais necessitados. Como agradecimento, estes retribuíam em géneros: batatas, feijão hortaliças ou então fruta da época. O médico, em compensação, entregava-os no Hospital de Óbidos. Aqui, por sua iniciativa, muitos doentes seus foram observados conjuntamente com outros colegas médicos. Algumas vezes, chegava a mesmo a transportá-los no seu próprio carro… Mas, o caso mais marcante passou-se com uma doente da Povoação do Pó. Foi mandado chamar por volta da meia-noite, levantou-se da cama e lá foi ele... Diagnosticou a doente - uma senhora já de certa idade - prescreveu a terapeuta adequada e depois recebeu o valor da consulta que a paciente solicitamente fez questão de pagar. Regressou a casa, deitou-se, mas esposa apercebeu-se que o marido estava intranquilo. Este contou-lhe o que se passara, levantou-se novamente da cama e foi a casa da senhora entregar o dinheiro da consulta porque poderia precisar dele … Já de regresso, deitou-se de novo e adormeceu… dormindo tranquilamente e em paz o resto da noite.
Mais tarde, por volta de 1977, o Dr. Campos fora internado no Hospital de Santa Maria em Lisboa. Estava bem mais magro, com o corpo armadilhado de tubos e soro inalado a correr a conta-gotas do alto de uma garrafa... Sabia do mal que padecia e não valia a pena tentar iludi-lo. Era nos pulmões…
Contou que deixara de fazer consultas domiciliadas por não poder mais – a sua saúde não o permitia - e fora então exercer medicina para Hospital de Caldas da Rainha. Confidenciou à única pessoa de Olho Marinho que o fora visitar, que o seu vencimento era o de um cacheiro viajante: 1.500$00! Que os únicos bens materiais que possuía fora os que recebera dos seus pais por herança. Foi com eles que comprou o único carro que teve na vida: um Volkswagen carocha!
O Dr. Campos residia na freguesia de Amoreira – numa moradia ajardinada - onde estava instalado o Consultório da Amoreira. Além disso, vinha também fazer consultas Olho Marinho, num consultório localizado num 1º andar da Casa Regedor da Freguesia, senhor José Dias. O acesso fazia-se por uma porta independente, subia-se umas escadinhas até ao hall - espécie de varandim quadrangular - e só depois é que se entrava no consultório.
A moradia do Regedor, que integrava uma adega colada à fachada principal, prolongava-se depois por um muro descendente até quase ao largo da fonte, fazia a curva e voltava a subir do outro lado, por uma vereda, até pegar novamente residência do Regedor. A sua frente ficava um pátio, baptizado por Largo do Zé Dias. Este Largo confinava com a parte lateral da “escola velha” e a residência do Padre Renato.
O Dr. Campos era também uma pessoa alta, bem constituída e usava óculos. Tinha sempre muitos doentes para tratar e era muitas vezes chamado de noite. Deslocava-se entre as freguesias do concelho de Óbidos – Vau, Usseira, Gaeiras, Olho Marinho e até a Povoação do Pó – num Volkswagen que comprara com a herança que recebera dos pais, conforme confessara um dia mais tarde, quando esteve hospitalizado no Hospital de Santa Maria.
O Dr. Campos era também uma pessoa muito impulsiva e não tinha papas na língua. Os doentes que não se portavam bem, não seguissem as suas prescrições mínimas, tinham que se haver com ele… Naturalmente, naquela época, não se fazia lá muitas dietas e sobretudo bebia-se bastante álcool – vinho e bagaço. Atrás das bebedeiras, lá vinham as cirroses (barriga de água…), úlceras, os reumatismos, etc. Por conta disso, o Dr. Campos é que se esfalfava a fazer visitas ao domicílio, rua acima rua abaixo: ver os seus doentes crónicos. Era pois natural que alguns deles ouvissem algum responso menos agradável. Aliás, até o Padre Renato, por outras razões, ouviu da parte do médico um desabafo nada lisonjeiro. Conta-se que numa ocasião em que o médico vinha a sair do seu consultório e se dirigiu ao seu carro, ao ligar as chaves, este não pegou logo. Então o Padre que estava por perto, “mete-se com ele” e diz: então Dr. o seu carro não pega? O médico, como que a pensar alto, desabafa: Olha quem! Anda sempre com a merda do carro dele avariado e vem agora falar do meu… O Padre Renato fingiu que não ouviu e foi a vida dele!
O Dr. Campos fumava bastante e tinha uma asma crónica. Ainda assim, andava sempre num frenesim. A par do seu feitio, era uma pessoa de grande generosidade e de uma sensibilidade sem limites para com as pessoas de parcos recursos. Muitos doentes não tinham só dificuldades em pagar as suas consultas mas ainda em comprar os medicamentos que lhes eram prescritos. O Dr. Campos conhecia as suas dificuldades e por isso não cobrava dinheiro pela maioria das consultas que fazia. Além disso, ainda retirava medicamentos do Hospital da Misericórdia de Óbidos - onde também prestava assistência - para entregar aos pacientes mais necessitados. Como agradecimento, estes retribuíam em géneros: batatas, feijão hortaliças ou então fruta da época. O médico, em compensação, entregava-os no Hospital de Óbidos. Aqui, por sua iniciativa, muitos doentes seus foram observados conjuntamente com outros colegas médicos. Algumas vezes, chegava a mesmo a transportá-los no seu próprio carro… Mas, o caso mais marcante passou-se com uma doente da Povoação do Pó. Foi mandado chamar por volta da meia-noite, levantou-se da cama e lá foi ele... Diagnosticou a doente - uma senhora já de certa idade - prescreveu a terapeuta adequada e depois recebeu o valor da consulta que a paciente solicitamente fez questão de pagar. Regressou a casa, deitou-se, mas esposa apercebeu-se que o marido estava intranquilo. Este contou-lhe o que se passara, levantou-se novamente da cama e foi a casa da senhora entregar o dinheiro da consulta porque poderia precisar dele … Já de regresso, deitou-se de novo e adormeceu… dormindo tranquilamente e em paz o resto da noite.
Mais tarde, por volta de 1977, o Dr. Campos fora internado no Hospital de Santa Maria em Lisboa. Estava bem mais magro, com o corpo armadilhado de tubos e soro inalado a correr a conta-gotas do alto de uma garrafa... Sabia do mal que padecia e não valia a pena tentar iludi-lo. Era nos pulmões…
Contou que deixara de fazer consultas domiciliadas por não poder mais – a sua saúde não o permitia - e fora então exercer medicina para Hospital de Caldas da Rainha. Confidenciou à única pessoa de Olho Marinho que o fora visitar, que o seu vencimento era o de um cacheiro viajante: 1.500$00! Que os únicos bens materiais que possuía fora os que recebera dos seus pais por herança. Foi com eles que comprou o único carro que teve na vida: um Volkswagen carocha!